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breve intervalo

E fez da vida ao fim…

O Paradoxo da Escrita Simples

Abril 28, 2023

Apesar de os seus estilos literários serem diferentes os dois escritores dos meus últimos livros lidos demonstram uma habilidade notável para criar personagens e ambientes realistas de forma expressiva e evocativa. Através de imagens vívidas de uma ideia sobre sociedade portuguesa, em épocas diferentes, aplicam elementos culturais comuns: o nosso conservadorismo, hospitalidade, até mesmo uma éspecie de Fado (esta ideia, a desenvolvê-la, desviar-me-ia do assunto deste texto). Embora não contemporâneos e distintos entre si, Júlio Dinis e José Cardoso Pires têm em comum o facto de serem escritores portugueses empenhados nos temas sociais e políticos inseridos nas suas obras, recorrendo a um estilo único e (aparentemente) simples.

Seja a retratar a vida rural de Portugal do século XIX ou as tensões políticas da ditadura salazarista no século XX, os dois escritores fazem literatura ao dar voz a marginalizados e oprimidos pela denuncia de variadas injustiças sociais. A simplicidade das narrativas de Júlio Dinis e José Cardoso Pires pode ser uma característica comum, mas isto não implica uma facilidade em escrever de forma clara, concisa, e ainda assim ter uma voz distinta. Nestes contornos torna-se paradoxal a elementaridade da escrita destes escritores, pois ela existe em cada um associada a um estilo único. Esta simplicidade narrativa, para mim não existente, dá uma ideia de facilidade, mas na verdade são formas de escrita sofisticadas, requerem um elevado nível de trabalho e talento para serem bem-sucedidas.IMG_6112.jpeg

O domínio da língua, bem como um entendimento do assunto sobre o qual escrevem torna-se essencial e isto parece-me surgir à custa do talento muito específico de trabalharem imenso. Ambos o faziam. É preciso escolher a palavra certa, construir coerência e criar ritmos agradáveis, tudo isto enquanto há clareza, precisão e muitas vezes com mais de um sentido inerente. Neste espaço comum da simplicidade acontece muitos leitores acabarem por subestimar a dificuldade de se escrever de forma articulada e simples. Aprecia-se o texto pela sua epiderme e isto surge-me redutor, ou entrega-se esses escritores ao esquecimento por se acharem datados ou menores. A facilidade das opiniões de leitura hoje debitadas dizem muito mais dos leitores, não tanto do trabalho do escritor. Contudo vemos o trabalho sério deste último na faca pela leitura frívola, exercida apenas na tangibilidade do prazer imediato não só do livro, mas também da rede social. Não precisamos de tempo para ler melhor, precisamos apenas de o fazer.

Assim, José Cardoso Pires parece-me surgir como uma sombra imaterializada do homem vencedor do Nobel, agora chamam-lhe mestre. Júlio Dinis pecou por não ser Camilo ou Eça ,e arrisco a dizer só se 'entender' Eça. Daqui decorre não somente a perda de cultura, perde-se literatura por si só não abundante. Há uma falta de espaço porque ocupado por esse caudal maior onde o resto tem de funcionar como menor até secar. O paradoxo da escrita simples surge-me da aparente contradição entre a simplicidade e a dificuldade de alcançá-la com eficácia, dos mecanismos de entrega onde a maioria não tira proveito na leitura. Há os escritores para estúpidos e outros não lêem escritores interiorizados como fazê-los passar por tal. Há formas de escrita de uma simplicidade árdua, e estes dois escritores para o seu mal talvez o tenham feito bem demais.

Coimbra, Conimbriga e Buçaco

Abril 25, 2023

No último domingo dia 23 era para ter ido a Viana do Castelo, contudo acabamos à última por trocar o norte pelo centro e ir até  Coimbra. De Coimbra gosto particularmente da Universidade, um local histórico e impressionante que data do século XIII. Estudar neste ambiente conimbricense será mágico, ao contrário do Porto onde estudei, pelo menos na minha perspectiva. Pela hora do almoço o passeio pela cidade levou-nos a um pequeno restaurante italiano perto da Sé antiga, o Italianino, do qual saímos a rebolar! A comida estava deliciosa e o ambiente era acolhedor e relaxante. 

Depois do almoço (e de forma não programada) o dia continuou em Conimbriga, datada pelo menos desde a idade do bronze e posteriormente uma das maiores e mais bem preservadas cidades romanas em Portugal. Visitamos a sua estação arqueológica onde também se situa o Museu Monográfico de Conimbriga. É incrível a quantidade de história e beleza deste local em Condeixa-a-nova. Vim embora com uma nostalgia estranha, talvez aquela que o George Steiner refere, a do absoluto.

 

Ao olhar para o passado conseguimos absorver a realidade de forma condensada e maquilhada, até nas tristes lápides em que estendia o olhar encontrava uma firme beleza. Talvez seja o facto de nunca ter contactado com uma realidade destas além dos livros, documentários ou filmes. Há nesta minha experiência uma concretização de finitude e passado. Ainda muito poderia escrever sobre o que vi em Conimbriga mas a preguiça e a ferrugem nas andanças de um blog levam-me a terminar o post em breve.

Ao voltar para casa houve ainda tempo para visitar o Buçaco na freguesia do Luso e apreciar a vista deslumbrante da serra. Na mata nacional do Buçaco vimos o Palace Hotel do Buçaco, irradiava ares de Regaleira, e também o convento de Santa Cruz do Buçaco. Caminhou-se até ao topo da serra, a vista panorâmica da região é de tirar o fôlego e definitivamente vale a pena a subida. 

 Estes passeios acabam por me trazer algum real em intervalos de dias artificiais. A ida a Conimbriga já foi como um aperitivo  para as férias que se aproximam!

Sobre

21aafb00b84d1f9249b0b9a10481d2f3.pngO blog enquanto página pessoal tem como objectivo trazer um registo da vida que se insurge à correria do dia a dia, intervalos no intervalo. O "breve intervalo" surge como pausa, reflexão e memória do não empregue nos meus cadernos. Ao fim, essa outra vida trivial: a das opiniões, dos passeios, do não se querer esquecer e manter em permanente rascunho.

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